O presidente da EDIA considera a iniciativa do Santander de dar destaque a empreendedores na agricultura “muito importante pelo efeito inspiracional”, uma vez que vem dar visibilidade a projetos extraordinários e que, por vezes, não são conhecidos. Nesta entrevista, José Pedro Salema revelou o arranque, na semana passada, da construção do primeiro painel solar flutuante, que fará parte do plano de geração de energia solar para autoconsumo de Alqueva, e falou dos primeiros produtores de canábis para fins medicinais que já estão instalados no Alqueva.
Qual tem sido a taxa de adesão dos agricultores ao regadio? A EDIA tem conseguido dar resposta?
Globalmente tem sido uma adesão muito boa. Os agricultores têm aderido ao regadio até mais depressa do que o que tínhamos antecipado. As obras no Alqueva acabaram há pouco tempo. Só na campanha de 2016 é que tivemos a área toda equipada da primeira fase do projeto. Em 2018 ultrapassámos os 80% de taxa de adesão, ou seja, conseguimos ter 80% de área regada sobre a área total equipada. Este ano vamos continuar e na campanha de 2019 esperamos regar perto de 95 mil hectares. Os agricultores reconhecem que o regadio no Alentejo tem tido resultados extraordinários. Há bons solos, bom clima e muita radiação solar, mas faltava a água. Foi essa falta que o Alqueva veio cobrir. Hoje temos produções interessantes para uma grande variedade de culturas: olival, amendoal, hortícolas, frutas e milho. E os agricultores conseguem produtividades muito interessantes.
Para que zonas está prevista a expansão do regadio?
A grande mancha de regadio é em Beja, desde Ferreira do Alentejo até Serpa. Depois, há outra a sul de Évora. Onde pode chegar? Temos em curso um plano de expansão da rega para 50 mil hectares que está em torno da mancha existente.
A segunda fase de expansão do regadio do Alqueva é o fim do projeto??
Depois desta expansão haverá sempre melhorias a fazer. Mas nunca a esta grande escala; não poderá crescer muito mais. Ainda não descobrimos forma de esticar a água. A água é finita. E os agricultores precisam de grandes quantidades por hectare. A não ser que se descubra uma espécie que gaste metade da água do que as atuais.
Na semana passada começou a obra do primeiro painel fotovaltaico. O plano é ambicioso e vai estender-se pelos próximos dois anos. O objetivo é gerar energia que será usada nas nossas bombas.
Os produtores do Alqueva estão a integrar bem a agricultura de precisão?
Temos em prática um projeto de eficiência agrícola de referência mundial. Alqueva tem a sorte de ter sido criado com tecnologia do seculo XXI. Os agricultores usam a tecnologia digital, a agricultura de precisão. Agora é a norma. Usam a rega científica; os dados de humidade do solo para garantir que regam na medida certa, nem mais uma gota. Há sempre um caminho de melhoria, mas hoje temos em Alqueva agricultores que são os melhores nas culturas que desenvolvem. São os melhores produtores de azeite e de milho, são referências mundiais.
Que novos investimentos agrícolas têm surgido no Alqueva?
Nos últimos anos, o amendoal é a cultura que tem gerado mais interesse, principalmente da parte de investidores americanos e espanhóis. Em número e em área, os investidores portugueses dominam claramente, mas os estrangeiros têm os projetos maiores e por isso têm mais visibilidade. Os dez maiores projetos são estrangeiros: ao todo, 150 são estrangeiros, dos quais cem são espanhóis e os outros 50 têm origem em 30 nacionalidades. Este ano têm aparecido também muitos investidores com interesse na cultura da canábis para efeitos medicinais. Ainda esta manhã falei com um desses investidores.
Já há produtores de canábis licenciados a trabalhar no Alqueva?
Já há pelo menos dois operadores autorizados com licenças do Infarmed para produzir canábis para efeitos medicinais. Aqui na zona do Alqueva há uma empresa grande que produz perto de Aljustrel e outra que tem as estufas perto de Beja.
Em que ponto está a construção dos painéis fotovoltaicos flutuantes para reduzir o custo com a energia?
Na semana passada começou a obra do primeiro painel fotovoltaico. O plano é ambicioso e vai estender-se pelos próximos dois anos. O projeto de 45 milhões de euros está a ser financiado pelo Programa Nacional de Regadios e por empréstimos concedidos pelo Banco de Desenvolvimento do Conselho da Europa, que apenas empresta a Estados e a entidades estatais. Para que a água chegue aos agricultores precisa de ser bombada e para isso precisa de energia. O projeto fotovoltaico é para autoconsumo, para gerar energia que será usada nas nossas bombas. Ainda produzimos energia elétrica por meio das barragens e nas mini-hídricas. Mas esta solução está a chegar ao fim. Não é possível fazer mais mini-hídricas nesta fase, é um caminho já percorrido. O futuro passará por outras fontes de energia e uma delas é evidente: o sol. Estamos localizados no ponto da Europa com melhor radiação solar e onde há mais horas de sol. Temos espaço para colocar os nossos painéis solares, não em terra, mas sobre a água, a flutuar, como se fosse uma jangada, uma ilha flutuante.
Como é que a EDIA responde ao período de seca no Alentejo?
As secas são determinadas pela quantidade de chuva e neste ano não choveu muito. Nas zonas de regadio não podemos falar de seca. Como fornecemos a água artificialmente, no regadio não há seca. Seria considerado período de seca no caso de o nosso reservatório estar vazio ou termos um problema de distribuição que nos impedisse de levar a água onde queremos. Diz-se que os anos de seca para o regadio são os melhores, que são anos de menos humidade, menos doenças, quando há mais radiação [e não falte a água] as plantas podem crescer mais. Claro que precisamos da chuva para ter água na barragem. É difícil “ter sol na eira e chuva no nabal”, é um pau de dois bicos. O mundo não é ideal e ainda não conseguimos comandar a chuva. Mas a barragem de Alqueva foi pensada para enfrentar três anos de seca extrema.